Em algum momento da trajetória escolar (e também da vida no geral), nos ocupamos com fenômenos do magnetismo e agora chegamos no momento de tentar criar um modelo mental do que acontece por trás dos imãs e fenômenos magnéticos no geral.
Ainda veremos que o magnetismo tem uma ligação estreita com a eletricidade, como observado já por Hans Christian Orsted em 1819, mas, no momento, vamos considerar os dois fenômenos como sendo relativamente separados.
O “magnetismo” não é um termo atual, inclusive existem registros datados do século 18 (“A Treatise Of Artificial Magnets: In Which Is Shown An Easy And Expeditious Method Of Making Them, Superior To The Best Natural Ones (1751) – John Michell”) da fabricação de imãs, o que significa que a magnetização de metais já tinha com certeza sido observada. Mais surpreendentemente, existem indícios de bússolas na China, chamadas de “south pointer” datadas de algum momento da dinastia Han – entre século 2 AC e século 2 DC (https://www.smith.edu/hsc/museum/ancient_inventions/compass2.html ).
A magnetização de metais é um fenômeno no qual um metal que, à princípio, não apresenta uma “atração magnética” passa a apresentar tal atração depois de ser exposto a um campo magnético suficientemente forte. Essa “multiplicação” do magnetismo parece levantar mais perguntas do que respostas, assim como todas as melhores descobertas da ciência.
Uma das tentativas de explicação desse fenômeno apareceu em 1900, quando James Ewing propôs a existência de “domínios magnéticos”, então vamos por partes tentar entender o que essa ideia está implicando.
A ideia é que alguns materiais (alguns metais, mais especificamente) são compostos por regiões que apresentam esse fenômeno de magnetização em alguma direção. Essas regiões são os tais dos domínios magnéticos. Vamos imaginar então que o material em questão está dividido nos seguintes domínios:

Cada um dos domínios tem uma orientação diferente de magnetização. Isso significa que, a grosso modo, “a força magnética nas regiões aponta em uma direção para cada domínio”. A frase fica entre aspas pois ela é mais simples do que correta, mas explica a ideia bem o suficiente para o momento. Logo vamos elaborar essa explicação de forma mais satisfatória.
Então imaginamos que cada um dos domínios de magnetização aponta em uma direção qualquer:

Esse metal seria, muito provavelmente, considerado como não magnético nesse estado. Isso porque cada um dos domínios aponta em uma região diferente e eles acabam todos “se cancelando”. Sob a presença de um campo magnético externo \(\vec{B}\) suficientemente forte, esses pequenos campos magnéticos dos domínios são influenciados e acabam “sendo atraídos” para o mesmo lado, assim como o ponteiro de uma bússola.

Depois de atraídos, esses domínios permanecem, mais ou menos, da mesma forma. O próprio campo magnético gerado pelos domínios é o suficiente para manter um certo nível de organização no sistema. Por conta disso, mesmo “desligando” o campo magnético externo, o metal continua magnetizado.

A partir de agora o termo “magnetizado” carrega para nós uma conotação de que há algum tipo de alinhamento das estruturas da matéria dentro do metal, mas ainda não está claro que tipo de estrutura é essa que causa o campo magnético. Por sorte, a descoberta do elétron (John Thompson – 1897) e a descoberta do proton (1911 – Ernest Rutherford) permitiram uma melhor compreensão da estrutura nuclear do universo, o que leva, por sua vez, à necessidade de alguns postulados da mecânica quântica, mas, ao mesmo tempo, a uma possível resposta para nossa indagação.
Muitas palavras complicadas de uma vez, então vamos entender o que acontece. Quando falamos de objetos extremamente pequenos, como o núcleo de um átomo, por exemplo, as leis da física que parecem reger o mundo a nossa volta se comportam de forma um pouco diferente. Por conta disso, para descrever e explicar esses fenômenos, foram desenvolidos esses postulados da chamada “mecânica quântica”: Leis básicas que funcionam de base para entendermos como esse mundo funciona.
Algumas regras foram postuladas teoricamente e duram até hoje. Para algumas delas não temos uma explicação “mais fundamental”, ou seja, uma explicação baseada em outra lei que “justifique” a forma com ela funcione. Um desses exemplos é o chamado “spin” dos elétrons.
Assim como objetos tem carga, massa e outras características chamadas “intrínsecas”, outras grandezas começam a aparecer com os postulados da mecânica quântica, que também são “inatas” de alguns objetos. Mais uma dessas propriedades intrínsecas que observamos para elétrons e prótons foi chamada de spin. Assim como a massa do elétron, que é um valor igual para todos os elétrons, o spin é outro valor que se manifesta na mesma magnitude para todos os elétrons. Infelizmente ele não tem uma versão macroscópica com a qual possamos relacionar diretamente, assim como a massa ou a carga.
A massa, que observamos também no dia-a-dia, é uma grandeza chamada “escalar”. Isso significa que ela é somente um valor, como 70Kg, 100g e assim por diante. A carga tem um comportamente parecido, com a diferença de que ela costuma ser tanto positiva quanto negativa. O spin, por outro lado, não é uma grandeza escalar, mas sim uma grandeza vetorial, o que significa que ele tem também direção e setindo. Essas direções dos spins são o que causam as direções de magnetização dos domínios!
Mais informações interessantes sobre spins e sua relação com magnetismo podem ser encontradas em: Texto 1
O experimento que consolida a existência desses spins foi, até onde eu saiba, o de Otto Stern and Walter Gerlach em 1920.
Uma boa explicação, ainda que para um público mais familiarizado, pode ser encontrada em: Texto 2